Rio, 24 de Junho de 2008 - A acumulação de dívidas em escala individual pode ser um drama resultante de desemprego eventual, doença em família ou, pior, uma patologia controlável, mas incurável, caracterizada por compulsão consumista capaz de colocar vidas em risco. Na última pesquisa sobre inadimplência realizada pelo Clube dos Diretores Lojistas do município do Rio, o descontrole de gastos, um indício de patologia, foi responsável por 11,4% das notificações. A mensuração do problema varia de acordo com a fonte. No serviço de atendimento especializado mantido pela Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, estima-se que o transtorno de impulso atinja 8% da população.
Parte do rol de enfermidades catalogadas e reconhecidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a compra compulsiva, também conhecida como oneomania, integra o grupo dos chamados transtornos de impulso, que podem chegar à obsessão. E acaba por desembocar no endividamento em cascata, que acaba destruindo patrimônios, dissolvendo famílias e, em alguns casos, até causando suicídios.
Maioria feminina Também há números diferentes, mas todos convergem na indicação de que as mulheres são maioria entre os compradores compulsivos. Segundo o neuropsicólogo Daniel Fuentes, do Ambulatório de Jogo Patológico e outros Transtornos de Impulso do Hospital das Clínicas de São Paulo, a participação feminina poderia chegar a 80%. Já a psicóloga Ângela Duque reconhece a maioria feminina no grupo, embora acredite que haja subnotificação dos casos de homens que compram compulsivamente.
No Rio, há duas correntes para o enfrentamento do problema. Uma funciona nos Devedores Anônimos - DAs (www.devedoresanonimos-rj.org), grupo de ajuda mútua nos moldes dos Alcoólicos Anônimos, com proposta de fazer com que o comprador compulsivo reaprenda a lidar com o dinheiro, estabelecendo metas de comportamento e postura. Tem reuniões nas manhãs de sábado, na Rua México 90, 9° andar.
Outra corrente, de abordagem clínica, funciona desde o ano passado no Serviço de Psiquiatria da Santa Casa do Rio. São atendidos também jogadores compulsivos, que muitas vezes igualmente acabam no grupo dos altamente endividados. O número de casos deste último grupo aumentou consideravelmente com o funcionamento das casas de bingo e caça-níqueis na cidade - atualmente proibidas.
Tragédia em família Um caso típico de atendimento nos DAs do Rio é o do bancário Julio (nome fictício), 58 anos, funcionário aposentado do Banco do Brasil. Casado há 31 anos, com dois filhos, há alguns anos começou a apresentar o quadro típico: compra centenas de CDs, às vezes dois ou três iguais, que não escuta. Assina três jornais, que ficam amontoados sobre a mesa da sala sem serem abertos, e traz para a casa toda a sorte de quinquilharias. Tudo à custa de empréstimos, primeiro em bancos, depois em financeiras, por fim com agiotas.
Sua mulher, que já abriu processo de separação, foi obrigada a vender um apartamento depois que começaram a aparecer diante de sua porta capangas enviados por agiotas, popularmente classificados de "armários", para cobrarem dívidas. Nem o fato de ser católico praticante, que vai à missa todos os domingos, o livra de dívidas que hoje, só com um banco e uma financeira, chegam a R$ 42 mil.
(Gazeta Mercantil - Ubirajara Loureiro)
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